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Tudo o que sempre quis saber acerca da História das Flores Prensadas

Sem dúvida que atualmente se pode afirmar que as flores prensadas estão na moda, com cada vez mais artistas a dedicarem-se a esta forma de preservar a beleza das flores e transformá-las em obras de arte. Mas este fascínio com a preservação da beleza das flores nesta forma não é recente, muito pelo contrário! Venha comigo numa viagem surpreendente pela História, que nos leva há mais de 3000 anos e a vários recantos do planeta!

1 – Primórdios: O fascínio pelas flores

É seguro assumir que a beleza das flores sempre fascinou os homens desde tempos imemoriais. Há evidências de que desde épocas pré-históricas as flores seriam usadas em túmulos, bem como para outros fins, como pigmentos ou fins culinários.

A busca pela preservação da beleza das flores terá começado cedo, havendo evidências de grinaldas de flores secas em túmulos do Antigo Egipto há mais de 3000 anos. Os egípcios acreditavam que as flores representavam o ciclo da vida e da morte. Usavam as flores também como cosmético, nomeadamente para fazer perfumes e óleos, e para fins rituais e cerimoniais. O lótus azul, por exemplo, era associado ao deus Nefertum e acreditava-se que tinha poderes curativos.

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Faraós a receberem ramo de flores

Sabemos que também na Grécia antiga já havia o conhecimento de que as flores podiam ser preservadas através da secagem, usando-as em grinaldas e coroas.

Mosaico grego

As flores eram também associadas ao panteão de deuses e deusas clássico, facto bem representado em obras de arte e literatura. Na Roma Antiga, as flores eram usadas em cerimónias privadas e públicas, correspondendo a símbolos de estatuto social e poder (as famosas coroas de louros dos imperadores são disso um óptimo exemplo).

O lírio, por exemplo, era associado à deusa Juno, e muito comum na decoração de espaços públicos. A rosa era associada à deusa do amor Afrodite, sendo por isso usada como forma de corte.

As flores são uma parte integrante dos mitos greco-romanos, carregadas de simbolismo. A rosa é um anagrama de Eros, filho de Afrodite, sendo que esta assim nomeou – em honra do seu filho – a mais bela flor criada por Clóris, a deusa das flores. Esta flor ficou para sempre associada ao amor romântico.

O narciso tem o seu nome para sempre ligado à figura da mitologia romana com o mesmo nome, que se apaixonou pelo seu próprio reflexo, não correspondendo o amor da ninfa Eco. Esta apela à deusa Némesis, que por vingança transforma Narciso em flor. O narciso simboliza por isso o amor não correspondido.

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“Narcissus and Echo” de John William Waterhouse, 1903

São inúmeras as referências a flores nos mitos e lendas durante a Antiguidade Clássica sendo estas por isso uma parte integrante no imaginário das populações europeias, o mesmo acontecendo no Oriente.

Na Índia por exemplo, durante a período Mughalas, as flores tinham um papel importante em vários aspectos da vida quotidiana. Os imperadores desta época eram conhecidos pelo seu amor por jardins e flores, tendo desenvolvido a arte dos arranjos de flores, conhecida como “phoolon ki chadar”. As flores eram usadas em cerimónias religiosas, decoração e fins medicinais.

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Pintura da dinastia Mughal

De volta à Europa, na Idade média, há inúmeras tradições que se relacionam com o uso de ramos de flores para afastar doenças das casas, bem como o uso de flores para fins medicinais. Era também comum por exemplo, espalhar alfazema no chão para purificar o ar das casas (e para impedir que os demónios escapassem do inferno!).

As flores e as plantas já tinham assim um papel significativo na vida das pessoas, quer ao nível do imaginário, quer integrando-as no dia-a-dia, nomeadamente as flores secas e preservadas. Mas será no Oriente, nomeadamente no Japão, que a prensagem de flores propriamente dita surgirá.

2- A “oshibana” japonesa

A prensagem de flores como forma de arte começa verdadeiramente no Japão durante o século XVI. Conhecida como “oshibana” (押し花), sabe-se que esta arte foi criada para preservar a beleza das estações em constante mudança e significa “pintar” uma imagem com elementos naturais, como as flores e folhas prensadas.

Apesar de ser uma ocupação acessível, requeria muito tempo e paciência, havendo necessidade de respeitar diversas fases, como colher a flor, preparar a flor para a prensa ou livro, prensar e verificar a prensa, aguardar que a flor fique completamente seca e prensada. Depois deste processo concluído (que pode corresponder a várias semanas ou meses) fazia-se então a composição artística inspirada na Natureza, usando flores e folhas prensadas, normalmente coladas em papel “washi”, de forma preencher um esboço feito de antemão.

Esta forma de arte era inclusivamente ensinada aos samurais, de forma a praticarem a paciência e a concentração, ligados ao ideal de convívio harmonioso com a Natureza. Os resultados são incríveis, mal podemos acreditar que não são pinturas!

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Arte de “Oshibana” com flores prensadas de Tatiana Berdnik

3- A passagem para Ocidente

Pensamos que o início das relações mais próximas dos europeus com o Oriente, nomeadamente com o Japão, poderá ter trazido esta forma de arte para a Europa no século XVIII.

A prensagem de flores surge na Europa não só como arte, mas também como método científico, pelas mãos dos exploradores e dos naturalistas, que usam herbários com plantas e flores prensadas de forma a catalogar espécies descobertas fora da Europa, mas também para sistematizar o conhecimento científico.

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Flores Prensadas do Museu de História Natural Sueco, Arborum, fruticum et herbarum flores et folia in insula Gothlandia collecta annis (1701-02), por Antonius Christophori Münchenberg

Houve quem aliasse o conhecimento científico à poesia, como é o caso da poetisa americana Emily Dickinson, que compilou durante a sua vida um herbário magnífico, que sobreviveu até os dias de hoje, estando atualmente preservado no Smithsonian Museum em Washington. Nele há mais de 1123 espécies preservadas, aliadas a inúmeras poesias da autora que são uma verdadeira ode à Natureza! O livro está editado em português pela editora Relógio d´água.

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Páginas do herbário de Emily Dickinson, 1839-1846
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Durante a época vitoriana do século XIX esta forma de arte tornou-se moda na sociedade. Foi especialmente expressiva em Inglaterra nas classes sociais médias e altas (a própria Rainha Vitória prensava flores como formas de preservar memórias) e nos Estados Unidos. Era uma forma de as senhoras da sociedade estarem próximas da Natureza (um dos principais ideais do Romantismo do século XIX) e de desenvolverem os seus dotes artísticos. A prensagem das flores tinha também uma conotação simbólica, já que era uma forma de preservar flores com significado afectivo ou com um simbolismo especial. As senhoras passavam assim muito tempo nos seus jardins e em passeios pelo campo a colher flores que depois prensavam em livros ou em prensas próprias de madeira.

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“Young Woman Pressing Flowers into A Collecting Book Moonrise and Memories”, de Frederick Appleyard (1874 – 1963)

É na época vitoriana que surge também a floriografia ou os dicionários de flores, baseado no livro “A Linguagem das Flores” de Charlotte de la Tour. A cada flor é atribuída um significado e estas eram enviadas ou usadas pelas senhoras de forma comunicar sentimentos variados – numa época em que estes não eram falados abertamente em sociedade.

Por exemplo, uma rosa vermelha significa paixão, mas uma rosa amarela significa que esse amor já não é correspondido. Eram, pois, uma forma de enviar mensagens codificadas, transmitidas em bailes ou outros eventos sociais, através de pequenos ramos florais que as senhoras usavam no vestuário, preso no peito, no pulso ou mesmo no cabelo (o local onde se usava as flores também correspondia a um significado diferente!).

A popularidade deste fenómeno floral atravessou toda a Europa e Estados Unidos, sendo um passatempo cheio de simbolismo, sentimentalismo e nostalgia. A prensagem de flores aliava vários dos ideais vitorianos – o contacto com a Natureza, o Romantismo, o cultivo da Arte – e existem exemplos desta arte que nos chegaram em excelente estado de conservação aos dias de hoje. Havia ainda um cuidado particular na exibição das criações artísticas com flores prensadas, sendo muitas vezes emolduradas em arranjos elaborados, por vezes com pedaços de fita de cetim ou veludo a complementar as flores.

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Flores e algas prensadas da coleção de Gertrude Tredwell expostas na Marchant’s House em Nova Iorque
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Bouquet deposto na campa de Abraham Lincoln prensado em 1865, exposto na Western Reserve Historical Society, Ohio, EUA.

Em 1920 dá-se a publicação do livro „Flower of the Holy Land“, no qual Frederick Vester exibia flores prensadas colhidas em Jerusalém e outros países do Médio Oriente. Este exemplo acaba por aliar o carácter científico, exibindo espécimes florais e vegetais de um país distante, mas feito de forma artística, como se pode constatar pelas imagens.

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4- Modernidade

Um exemplo mais recente de uma acérrima defensora e praticante da prensagem de flores é Grace Kelly, que enquanto Princesa do Mónaco praticou a arte da “oshibana”, ajudando a promover a arte da prensagem de flores em todo o mundo. Era seu hábito prensar flores que lhe eram enviadas do estrangeiro. Escreveu inclusivamente um livro sobre o assunto “My Book of Flowers”, publicado em 1980, dois anos antes da sua trágica morte.  Nele, Grace Kelly escreveu estas delicadas palavras:

»Through working with flowers we began to discover things about ourselves that had been dormant. We found agility not only with our fingers but with our inner eyes in searching for line, scale and harmony. In bringing out these talents within ourselves, we gained a dimension that enabled us not only to search for harmony in an arrangement, but also to discover the importance of carrying it into our lives and our homes.«

Sem dúvida que esta contribuiu para que esta moda ressurgisse no final do século XX. Nestas imagens podemos ver Grace Kelly a finalizar um trabalho em “oshibana” e um exemplo da sua arte.

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Em 1993 Nobuo Sugino, mestre japonês na arte da “oshibana”, começa a viajar pelo mundo para recolher exemplares de flores prensadas, tendo em 1997, transformado a sua coleção no “International Pressed Flower Art Book”. Esta obra popularizou a “oshibana” no mundo inteiro, levando à emergência de várias organizações internacionais e ao reconhecimento da “oshibana” como uma forma de arte única. Desde 2010 que Nobuo Sugino é o presidente da International Pressed Flower Art Society que trabalha no sentido de manter a prática e a promoção da arte da prensagem de flores em todo o mundo.

Atualmente, esta forma de arte está cada vez mais na moda, sendo inúmeras as aplicações dadas às flores prensadas, quer sejam mais semelhantes às clássicas, como para fazer quadros e composições artísticas inspiradas na Natureza, quer seja como forma de preservação de bouquets de noiva ou de aniversário, ou mesmo para fazer joalharia, ou os mais variados objectos usando resina, madeira, vidro, entre muitos outros.

Ainda no ano passado, em 2023, o New York Times escreveu um artigo acerca das flores prensadas, intitulado “Why Are People Still Pressing Flowers? It’s a Form of Storytelling” no qual mostra o trabalho incrível da Lacie Porta da Framed Florals e demonstra que esta arte está definitivamente de volta ao coração de muitos artistas.

Quer o pratiquemos como passatempo, quer seja uma paixão a que nos dedicamos a tempo inteiro, é extremamente compensadora e terapêutica. Um actividade que nos obriga a estar em contacto com a Natureza, a compreendê-la e, acima de tudo, a respeitá-la.

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